quarta-feira, setembro 30

Domingos, intuição e emoção

Votar para escolher como vamos ser governados é um assunto sério. Mas votamos em face de escolhas racionais? À primeira vista não há razão para o negar. Assim, a visão mais simples do que se passa num domingo de eleições é que cada um vota de acordo com o julgamento que fez das políticas em competição, tendo naturalmente em vista a que intui que melhor se ajustará à satisfação dos seus interesses ou de um interesse colectivo.

Na verdade não me parece que seja bem assim. Estou a conjecturar gratuitamente, eu sei, mas olhar para o que se passa dá-nos o direito de formar algumas convicções. Ora eu estou convencido que uma enorme parte dos eleitores age nos tais domingos em função de uma adesão emocional, não totalmente consciente, a certa área ou linha do espectro político. Assim, aquilo que se escolhe ao domingo pode ter pouca relação com a inteligência de cada um ou com a sua capacidade de ler a realidade sem preconceitos. Daí que, por exemplo, pessoas inteligentes e com honestidade a toda a prova votem descansadamente em dirigentes que no mínimo são próximos de cliques mergulhadas em corrupção. Na melhor das hipóteses, mesmo reconhecendo essa corrupção, desvalorizam-na em face daquela que afecta os partidos adversários do seu. Pelo contrário, pessoas menos emocionais fazem a sua escolha desapaixonadamente, frequentemente pelo critério de mal menor.

Isto passa-se nos tais domingos em muitos países democráticos.

No entanto (mais uma conjectura minha) o grau de emocionalidade presente na escolha não é o mesmo em todos os segmentos de preferência política ou ideológica. O modo e o grau com que isso sucede pode variar de país para país e em função de conjunturas particulares. Na Catalunha, os independentistas reuniram uma larga adesão do eleitorado, apesar da proximidade com a cúpula dos Pujol, fortemente suspeita de corrupção. Mas de um modo geral, em Espanha ou em Portugal, a escolha motivada por adesão afectiva, inconsciente, está presente com prevalência no espaço que por comodidade classificamos como "esquerda". O enorme apoio que o PS reúne, de acordo com as sondagens, é revelador de uma fé inabalável de larguíssimos sectores de cidadãos. Enquanto os que votam na "direita" (digamos assim, para usar a terminologia habitual), lá ou cá, não o fazem embevecidos com os líderes Passos ou Rajoy, não deixa de ser admirável como uma pessoa politicamente tão cinzenta e medíocre como Costa vem alimentando sonhos de regresso a um paraíso perdido.


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